
As olarias de Maragogipinho, no distrito de Aratuípe, guardam histórias moldadas no barro há séculos. Mas, para o jovem escultor Wesley Souza, de 28 anos, a argila que ele aprendeu a manusear aos cinco anos de idade o levou a um destino que ele jamais imaginou: as mãos de uma das maiores vozes da música brasileira.
No último sábado (15), durante o show histórico da turnê de 60 anos de carreira de Maria Bethânia, na Concha Acústica de Salvador, uma escultura de Iansã — orixá de cabeça da cantora — criada por Wesley foi entregue a ela como um presente do Governo da Bahia. O gesto, conduzido pelo governador Jerônimo Rodrigues e pelo secretário de Cultura Bruno Monteiro, selou uma conexão poderosa entre o talento emergente do Recôncavo e a consagração da MPB.
“Até agora estou sem acreditar”
A peça foi descoberta pelo secretário Bruno Monteiro durante o 3º Festival de Cerâmica de Maragogipinho, realizado na semana anterior. Encantado com a delicadeza e a força da representação de Oyá, ele adquiriu a obra com o propósito de presentear a cantora.
Quando soube do destino de sua criação, Wesley mal pôde conter a emoção. “Quando o secretário contou, fiquei sem reação. Maria Bethânia é uma pessoa sensacional. Fiquei muito feliz, até agora estou sem acreditar”, revelou o artista.
A reação de Bethânia ao receber o presente validou todo o esforço e devoção colocados no barro. Em vídeo, ela admira os detalhes da peça e elogia: “Muito bonita, que peça linda! Um presente lindo, trabalho maravilhoso”.

Ancestralidade moldada à mão
Para Wesley, a escultura vai muito além da estética; é uma expressão de sua própria raiz. Neto de Ialorixá, ele vê na modelagem dos orixás um chamado espiritual. “É legal poder expressar nossa ancestralidade através do barro. Acredito que essa foi a forma de orixá me trazer para as minhas raízes. Só tenho a agradecer aos orixás por sempre me darem direcionamento”, contou.
O processo criativo de Wesley é minucioso e totalmente artesanal. Cada peça leva de 15 a 20 dias para ser finalizada, respeitando os tempos de modelagem, secagem e queima — um ritmo que a natureza e a ancestralidade impõem. Hoje, ele vive exclusivamente de sua arte, provando que a tradição de Maragogipinho, reconhecida pela Unesco como o maior polo cerâmico da América Latina, segue viva e se renovando.
Para Bruno Monteiro, o momento simbolizou a união de duas pontas da cultura baiana. “Me sinto muito honrado em ser a ponte entre o jovem artista de Maragogipinho e a menina dos olhos de Oyá. Uma poderosa conexão de arte, festa, amor e devoção que só a Bahia proporciona”.
